Kant - Trechos de "FUNDAMENTAÇÃO DA METAFÍSICA DOS COSTUMES"

 
A vontade é concebida como a faculdade de se determinar a si mesmo a agir em conformidade com a representação de certas leis. E uma tal faculdade só se pode encontrar em seres racionais. Ora, aquilo que serve à vontade de princípio objetivo da sua autodeterminação é o fim (Zweck), e este, se é dado pela só razão, tem de ser válido igualmente para todos os homens.” p228
 
 

“Ora, digo eu: – O homem, e, duma maneira geral, todo ser racional, existe como fim em si mesmo, não só como meio para o uso arbitrário desta ou daquela vontade. Pelo contrário, em todas as suas ações, tanto nas que se dirigem a ele mesmo como nas que se dirigem a outros seres racionais, ele tem sempre de ser considerado simultaneamente como fim. Todos os objetos das inclinações tem apenas um valor condicional, pois, se não existissem as inclinações e as necessidades que nelas se baseiam, o seu objeto seria sem valor. As próprias inclinações, porém, como fontes das necessidades, estão tão longe de ser um valor absoluto que as torne desejáveis em si mesmas, que, muito pelo contrário, o desejo universal de todos os seres racionais deve ser o de se libertar totalmente delas. Portanto, o valor de todos os objetos que possamos adquirir pelas nossas ações é sempre condicional. Os seres cuja existência depende, não em verdade da nossa vontade, mas da natureza, têm contudo, se são seres irracionais, apenas um valor relativo como meios e por isso se chamam coisas, ao passo que os seres racionais se chamam pessoas, porque a sua natureza os distingue como fins em si mesmos, quer dizer, como algo que não pode ser empregado como simples meio e que, por conseguinte, limita nessa medida todo arbítrio (e é um objeto do respeito).” p.228-229

 

A moralidade consiste pois na relação de toda a ação com a legislação, através da qual somente se torna possível um reino dos fins. Esta legislação tem de poder encontrar-se em cada ser racional mesmo e brotar da sua vontade, cujo princípio é: nunca praticar uma ação senão em acordo com uma máxima que se saiba poder ser uma lei universal, quer dizer, só de tal maneira que a vontade pela sua máxima se possa considerar a si mesma ao mesmo tempo como legisladora universal.” p.233

 

“No reino dos fins tudo tem ou um preço ou uma dignidade. Quando uma coisa tem um preço, pode-se pôr em vez dela qualquer outra como equivalente; mas quando uma coisa está acima de todo o preço, e portanto não permite equivalente, então tem ela dignidade.” p.234

 

“Ora, a moralidade é a única condição que pode fazer de um ser racional um fim em si mesmo, pois só por ela lhe é possível ser membro legislador no reino dos fins. Portanto, a moralidade, e a humanidade, enquanto capaz de moralidade, são as únicas coisas que têm dignidade.” p.234

 

Kant, Immanuel. Fundamentação da metafísica dos costumes. In: Os pensadores. 1aed. São Paulo: Editora Abril SA, 1974.