Texto Nietzsche

 
 

TRECHOS DE

DA UTILIDADE E DESVANTAGEM DA HISTÓRIA PARA A VIDA

 

 

“(...) podemos ter a capacidade de sentir a-historicamente, de perseverarmos em direção ao mais importante e originário, uma vez que aí reside o fundamento sobre o qual pode crescer algo reto, saudável e grandioso, algo verdadeiramente humano. O a-histórico é similar a uma atmosfera que nos envolve e na qual a vida se produz sozinha, para desaparecer uma vez mais com a aniquilação desta atmosfera. É verdade: somente pelo fato de o homem limitar esse elemento a-histórico pensando, refletindo, comparando, separando e concluindo; somente pelo fato de surgir no interior dessa névoa que nos circunda um feixe de luz muito claro, relampejante, ou seja, somente pela capacidade de usar o que passou em prol da vida e de fazer história uma vez mais a partir do que aconteceu, o homem se torna homem. No entanto, em um excesso de história, o homem deixa novamente de ser homem, e, sem aquele invólucro do a-histórico, nunca teria começado e jamais teria ousado começar.”

 

“Se alguém estivesse em condições de inalar e respirar em inúmeros casos esta atmosfera a-histórica na qual surgiram todos os grandes acontecimentos históricos, então talvez lhe fosse possível, enquanto um ser cognoscente, elevar-se a um ponto de vista supra-histórico (...). Denominaríamos como supra-histórico um tal ponto de vista, porque alguém que o assume não poderia mais se sentir de maneira nenhuma seduzido para continuar vivendo e colaborando com o trabalho da história, uma vez que reconheceria a condição de todo acontecimento, aquela cegueira e injustiça na alma do agente; aquele alguém estaria curado do risco de tomar a partir de então a história exageradamente a sério, pois aprenderia com cada homem, a cada vivência entre gregos ou turcos, em uma hora do século um ou do século dezenove, a responder à pergunta como e para que se viveu.”

Nietzsche, F. Da utilidade e desvantagem da história para a vida. tradução Marco Antônio Casanova. – Rio de Janeiro : Relume Dumará, 2003